sábado, 20 de outubro de 2012

Por que é difícil dar limites aos filhos hoje?

Texto publicado dia 19/10/2012 no Jornal Opinião - Francisco Beltrão, PR.

        
         Hoje, é comum vermos crianças gritando, correndo e desobedecendo em restaurantes, supermercados, locais públicos (além de fazerem isso também em casa), sem horário para dormir, comendo o que querem. É comum vermos adolescentes pendurados no facebook e msn ao menos 4 horas por dia, desinteressados pelos estudos ou trabalho, desconhecedores dos protocolos sociais (documentos, impostos, contas) ou que tenham e cumpram obrigações domésticas em casa, como lavar a louça ou pagar uma conta no banco. Para constatar essas afirmações, basta sentar com uma mãe para tomar um chimarrão – e conversar. Também ouvimos isso nos consultórios, congressos, livros. Os pais, ao que parece, estão perdidos sobre os limites que devem aplicar a seus pequenos ou adolescentes... o que seria uma novidade, já que a geração anterior demonstra ter colocado rédeas nos filhos. Por que isso está acontecendo com os pais de hoje? Vamos tentar responder essa pergunta de forma objetiva, evitando, entretanto, a superficialidade. 
        Primeiramente, os pais sentem culpa por trabalhar fora o dia todo. Então, tentam compensar seus filhos, lhes poupando outras frustrações, fazendo e/ou dando quase tudo o que eles querem. Ou seja, criam um mundo perfeito para eles (quem não queria fazer tudo o que quer e ter tudo o que quer?). Só que o mundo aqui fora não é perfeito e, se seus filhos não aprenderem a lidar com frustrações dentro de casa, pior será lidar fora dela. 
         Em segundo lugar, os pais também acreditam que, se o jovem fica frustrado, é porque eles, pais, cometeram algum erro. Mais uma vez, o excesso de culpa que os pais vêm carregando. Um bom remédio para sanar essa culpa é o diálogo, tente conhecer mais o seu filho, saber o que ele gosta, os amigos com quem sai, o que ele pensa e faz. Conversem, passeiem, viajem, joguem bola juntos. Você vai perceber que aquela chateação do seu filho, lá no fundo, não tinha tanto a ver com você. 
            Em terceiro e último lugar, nossa própria sociedade está sem limites e sem referências. Vivemos num modelo de capitalismo tecnológico cujas instituições de base, que têm a função simbólica de lei, estão desregradas e falidas (sem credibilidade). Um modelo caracterizado pela enxurrada de informações, pela velocidade, efemeridade e superficialidade. E nossas relações são, consequentemente, assim delimitadas. Conduzimos nossas vidas num ritmo frenético, desprovido de tempo para maiores reflexões e aproveitamento de qualidade dos relacionamentos. Quanto às instituições, vemos que no Estado, temos roubalheira, falta de ética e de punição; as Famílias estão adotando novos modelos, há muito “junta-aqui”, separa lá, filhos daqui e de lá, o que requer um suporte afetivo que nem sempre ocorre; as Igrejas sofrem com os padres pedófilos e os pastores ladrões; as Escolas não conseguem mais dar conta de um papel que não é delas, tendo que dar a educação doméstica que os pais não tem tempo de ensinar aos filhos. Enfim: ninguém sabe direito o que é “certo” e... “tudo pode”, tudo que acontece ou se faz acaba por ser “normal”. Consciente ou inconscientemente, o modelo de sociedade em que estão inseridos, irá influenciar esses pais. 
        Nossa sociedade está perversa e demanda muitas horas de trabalho, e não há como compensar os filhos por isso, os trancando numa bolha perfeita. O limite ou o “não”, gera frustração. Por sua vez, a frustração ensina a tolerância. E é por meio da tolerância que se edifica pessoas mais humanas e resistentes psiquicamente. Os futuros adultos devem estar minimamente preparados para os desafios, tropeços e tragédias da vida, que serão encarados com mais força e equilíbrio - se quando crianças tiverem limites. A experiência da frustração é vital para a formação de um adulto normal, capaz de respeitar e de tolerar.

domingo, 14 de outubro de 2012

Abuso sexual: como identificar um pedófilo e tratar a criança abusada

Texto publicado no Jornal de Beltrão em 05/10/12 e no Jornal Opinião em 11/10/12 (http://www.jornaldebeltrao.com.br/artigos/as-recentes-contribuicoes-da-psicologia-e-medicina-no-diagnostico-de-abusos-sexuais-79021)

      
       Crianças que sofreram ou sofrem abuso sexual, em geral, permanecem em silêncio. Sentimentos como vergonha, medo de retaliação por parte do abusador e até a falta do entendimento de que está sendo violentada fazem a criança ou pré-adolescente se calar diante dos abusos, por vezes contínuos, de pessoas em 80% dos casos próximas ou parentes. Os danos psicológicos em decorrência deste ato são graves e podem afetar o futuro adulto de forma permanente. Contudo, diante do silêncio dos pequenos, o que podemos fazer para prevenir que eles sejam abusados e, ainda, como tratá-los?
      Pesquisas no ramo da psicologia nos mostram que os abusadores, quando confrontados, justificam suas ações tanto para a criança como para os adultos dizendo que seu abuso tem objetivo "educativo", como se, ao abusá-las, estivessem "ensinando" sobre sexo (total absurdo); ou que a criança o encorajou ou o seduziu. Manipulam-na bem, pedindo segredo sobre seu ato, e confundem seus sentimentos, fazendo emergir na criança ou pré-adolescente uma mistura de raiva, medo e amor. Imatura emocionalmente, a criança acaba por não se defender.
        Como identificar um pedófilo? Ainda segundo estudos da psicologia, os abusadores frequentemente são do sexo masculino, sendo raras as ocorrências em mulheres deste transtorno mental e sexual. Em geral, são pessoas aparentemente normais, têm emprego estável, convivem com os outros sem maiores problemas. Mas têm algumas peculiaridades: eles preferem carreiras que propiciem o contato com os pequenos ou então se engajam em atividades com eles; gostam de ganhar sua confiança e a dos pais; têm dificuldade nas relações interpessoais com pessoas de idade apropriada; elevado nível de agressividade-passiva; e também podem colecionar pornografia infantil. Apresentam, comumente, sentimentos de inferioridade, solidão, inadequação, baixa autoestima, disforia. Mais da metade deles são portadores de outras transtornos sexuais (parafilias) e psiquiátricos (de 50 a 60% têm transtornos afetivos, de 70 a 80% têm transtornos de ansiedade e de 70 a 80% têm transtorno de personalidade).
       Estudos médicos recentes, do PHD Jorge Ponseti, da Seção de Medicina Sexual da Universidade de Kiel, na Alemanha,  publicados na revista 'Archives of General Psychiatric", apontam a ressonância magnética como um instrumento valioso no complemento diagnóstico. Houve uma porcentagem de 95% de acerto, a partir da comparação com um grupo controle, sobre a reação do primeiro segundo frente a imagens de cunho sexual. Outros estudos de 2007, do PHD James Cantor, psicólogo clínico, também apontaram características diagnósticas do pedófilo, porém hoje se mostram inconclusivos.
        Apesar desses indicadores, o diagnóstico só pode ser feito por uma equipe multiprofissional especializada. A observação geral da criança ainda é o fator mais importante a que os pais podem ficar atentos. Se a criança passa a evitar um certo adulto que antes gostava ou verbaliza sobre assuntos relativos a sexo, ou ainda sobre algum contato íntimo, é fundamental encaminhá-la a um pediatra, para averiguar se houve dano às suas partes íntimas, e buscar o auxílio de uma psicóloga, dada a sua capacidade reduzida de se expressar verbalmente.
       Às vezes, o contato intrusivo por parte do abusador se reduz a carícias ou manipulação genital, e somente o depoimento da criança poderá ser a prova do abuso sexual. A ludoterapia e a psicoterapia poderão ser bons aliados das vítimas e da família, sobre como lidar e superar o ocorrido.

sábado, 6 de outubro de 2012

O ser humano adora a si mesmo


Texto publicado ontem no Jornal Opinião, onde inaugurei uma nova coluna, chamada "Fale com a Psicóloga".Falo sobre como nós, humanos, adoramos nossa própria espécie.  Confiram o texto de abertura.


 "Nós merecemos uma coluna sobre nós!

             É com prazer que inauguro esta nova coluna aqui no Jornal Opinião. O nome da coluna, 'Fale com a psicóloga', por si só, já pretende transmitir um ar de aproximação com os leitores, que poderão sugerir  temas, enviar perguntas sobre questões de seu cotidiano, dificuldades emocionais ou dúvidas. Nós, seres humanos, em geral temos uma paixão em comum: falar sobre nós mesmos, ou sobre os outros (confesse se você não adora saber o que acontece na casa do vizinho, do parente ou das celebridades). E isso ocorre por um motivo simples: adoramos tudo que é relativo a nossa espécie, até porque precisamos uns dos outros.
            Todas as formas de arte, o ápice da expressão humana, anunciam nitidamente essa necessidade e essa curiosidade que temos por pessoas - fazemos filmes, novelas, poemas, livros, tudo sobre nós. Logo, nos interessa, por exemplo, compreender o porquê dos comportamentos. E é aí que se encaixa a proposta desta nova coluna: contribuir para a felicidade do leitor, na tentativa de promover um espaço para reflexões sobre nós mesmos. Entender os motivos alheios, e os nossos próprios, para atitudes às vezes inexplicáveis, estranhas, transgressoras, contraditórias - alivia e cura. Melhora nossas relações e nos faz mais felizes.   
             Psicólogas são cientistas do comportamento. A psicologia é a ciência que estuda as condutas / comportamentos, suas disfunções e maneiras ou técnicas para tratamento, abarcando estudos da medicina e sociologia também. O curso tem uma duração mínima de cinco anos e tem grande reconhecimento em países como Estados Unidos, Inglaterra e França. Este ano, comemoramos os 50 anos da institucionalização da nossa profissão no Brasil. Por isso, achei importante relembrar que psicólogo não é exclusividade de “doidos”, ok? Atendemos gente, não importa o tipo de problema que tiver. Até porque, problema todo mundo tem.
            Diferentemente da medicina, que trata o paciente quando a patologia já se instalou, a psicologia tem também um caráter preventivo – aquele probleminha que te aperreia frequentemente, que aparentemente é “bobo”, ou que você diz que “vai passar com o tempo”, se tratado no consultório, pode lhe poupar um futuro transtorno mental, como a depressão, o TOC, entre outros. Ir ao psicólogo é uma questão de saúde, não de luxo, e sem dúvida aumenta e muito a qualidade de vida das pessoas e pode evitar o princípio ou o excesso de medicalização. 
            Felizmente, a procura às psicólogas está cada dia maior, o que mostra que a desinformação e o preconceito em relação a nossa profissão estão sendo quebrados, inclusive pela própria classe médica - médicos atualizados reconhecem a importância do acompanhamento multidisciplinar e encaminham seus pacientes para nós.  
            Sou recifense e resido aqui em Francisco Beltrão há dois anos e meio, onde tenho consultório. A realidade cultural e econômica daqui é bem diferente da qual estava habituada (embora me seja algo familiar, pois meu pai é gaúcho). Porém, aprendi a amar os aspectos díspares entre essas duas cidades, e uma coisa importante também pude aprender: gente é gente em qualquer lugar. Os problemas, as angústias, as dúvidas que recebo no consultório daqui, pouco variaram em relação aos que recebia no de lá. Pessoas querem ser felizes, pessoas querem angariar sentidos para a vida, querem melhorar suas relações, querem se entender. Pessoas querem ser ouvidas. Pessoas querem ser amadas.  E é nesse contexto universal de anseios humanos que pretendemos edificar essa coluna para vocês. Nós, pessoas, somos fantásticas sim, e merecemos uma coluna sobre nós. Todas as sextas teremos um encontro marcado aqui. Recebam meu empenho e carinho."

Introdução ao Blog

Blog é algo que todos que gostam de escrever, hoje em dia têm. Faz tempo que amigas me sugerem para abrir um blog profissional, e finalmente senti essa necessidade em mim, que sou blogueira há 7 anos (blog pessoal). Aqui publicarei textos meus já publicados em jornais, novidades sobre a psicologia, pesquisas afins, e textos com minhas opiniões acerca de tudo que for relativo a essa ciência incrível. Sou psicóloga formada há 4 anos e apaixonada por minha profissão. Minha história com a psicologia começou aos 11 anos e ela me auxiliou durante quase toda a minha adolescência e vida adulta. Penso que me tornei uma pessoa melhor por isso e, sem dúvida, essa foi a minha maior motivação para ser psicóloga também. Hoje, vejo a diferença que essa ciência faz na vida dos meus pacientes. O endereço "queremospsicologia", portanto, já está explicado: nós queremos a psicologia, por uma vida melhor. A todos que compartilham do mesmo desejo, bem-vindos a este blog!