domingo, 21 de abril de 2013

O arrogante e os psicopatas


     Texto publicado no Jornal Opinião dia 19/04/13

 
     Certa vez, tivemos um paciente internado na clínica psiquiátrica, que era considerado “insuportável” por todos da própria família e por boa parte dos profissionais do local. Era um senhor com seus 60 anos, aposentado de um alto cargo público, que estava um tanto adoentado e sofria de incontinência urinária, portanto tinha enfermeiras-acompanhantes 24 horas por dia. Ele as tratava mal, as humilhava, mas, creio que como lhes pagava bem, permaneciam no serviço. Ele tinha uma vasta cultura geral, falava em latim para se exibir, porém toda a sua inteligência em vez de lhe agregar charme, o tornava um arrogante desagradável e sem noção.
     Logo no início do plantão, pela manhã, fui atendê-lo. Um tanto receosa, contudo extremamente curiosa. Que tipo de pessoa, supostamente tão culta e inteligente, que ocupou por tantos anos um alto cargo público, não tem um mínimo de habilidade para se relacionar? Aliás, que faz questão de pisar nas pessoas? Isso é, no mínimo, um paradoxo. Supostamente, uma pessoa inteligente vai buscar boas relações para pelo menos não ser interditada numa clínica. Se não fosse por afeto, que fosse por manipulação, que é a base dos relacionamentos dos psicopatas. Estava curiosa para saber o que tinha ali: seria então psicopata clássico, de livro? Um sádico, narcisista? Qual o diagnóstico dele? E lá fui eu, chamá-lo para o meu primeiro atendimento do dia.
     A princípio, ele foi cordial, contou sobre si mesmo (seu assunto preferido), e o atendimento fluía normalmente. De repente, o homem começou a se exaltar e a me humilhar, afirmando que eu não era capaz de entendê-lo, que eu era burra, e, que para ser digna de compreendê-lo, seria necessário falar os 10 idiomas que ele falava, e ter todo o conhecimento histórico-político-geográfico-cultural e constitucional, que ele tinha. Finalizando, disse que eu era uma “ninguém”, e que se ele metesse uma bala no meio da minha cabeça, eu seria enterrada praticamente como uma indigente, e que ninguém nunca o puniria por isso. Porque ele era influente e invencível. Ele falou isso com grande frieza. Coisa de filme.
     Ele não estava em surto psicótico nem era esquizofrênico. Durante toda a sua fala, permaneci em silêncio, apenas deixei ele descarregar seu ódio. Contudo, não vou negar que o meu sangue ferveu quando ele me ameaçou de morte. Psicóloga também tem instinto de sobrevivência... e ego! Ser subestimada também me irritou. Mas, como de praxe, vi que minha raiva não fazia sentido, pois estava diante de um doente. Naquele ponto, já tinha a certeza de que ele era apenas mais um psicopata. Que droga, pensei, nada de inédito! Então apenas encerrei o atendimento dele, dizendo: “Por mais que o senhor se considere invencível, todos erram. E lamento dizer, mas o senhor perdeu, pois se deixou vencer pela arrogância, e é por isso que o senhor está aqui. Tenha um bom dia”. Ele ficou mudo, eu saí, e não o atendi mais, porque psicopatas, infelizmente, são irrecuperáveis.
     Relatei um caso clássico do tipo de psicopata que goza torturando as pessoas emocionalmente. Não pensem que psicopatas são aquelas pessoas com sede de morte, esse é um outro tipo, bem mais raro, o caso acima é a forma mais comum de psicopatia, e está mais perto de nós do que imaginamos. Todavia, arrogância não é uma exclusividade de psicopatas e pode cegar e adoecer pessoas comuns também. Melhor ser humilde, que ser miserável.   

sexta-feira, 12 de abril de 2013

VI Congresso Brasileiro de Avaliação Psicológica: Direito de todos, dever do psicólogo e o IX Congresso Iberoamericano de Diagnóstico y Evaluación Psicológica


Imperdível!


O VI Congresso Brasileiro de Avaliação Psicológica: Direito de todos, dever do psicólogo e o IX Congresso Iberoamericano de Diagnóstico y Evaluación Psicológica serão realizados de 04 a 07 de junho em Maceió-AL.
O evento será realizado no CENTRO DE CONVENÇÕES “AURÉLIO BUARQUE DE HOLANDA”, do Hotel Ritz Urban Resort, Maceió, AL.
Trata-se de evento nacional consolidado na área de avalição psicológica, a ser realizado pela sexta vez. Representa uma oportunidade para reunir pesquisadores, professores, estudantes e profissionais do país interessados na área da avaliação e medida em psicologia. As conferências, por conta de convidados renomados, deverão suscitar temáticas emergentes na área e reabrem debates clássicos; as mesas-redondas serão uma oportunidade para trocar idéias, debater temas recentes e propor novas estratégias de pesquisa e formação. Os painéis assegurarão a exposição de pesquisas e práticas de diversas partes do país, oportunidade em que se dará a conhecer o cenário da avaliação psicológica. Deverão ocorrer 24 mini-cursos, ministrados por nomes principais da avaliação psicológica, oferecendo a oportunidade de atualização e intercâmbio dos envolvidos. Este é, portanto, um evento importante, único na área.
O evento tem diversas finalidades. Pretende, principalmente, ser um espaço científico, acadêmico e profissional para reunir aqueles que têm feito a avaliação psicológica no Brasil, permitindo igualmente intercâmbio com pesquisadores de outros países. Seus objetivos são: (1) promover e incentivar estudos adequadamente realizados sobre testes, escalas e questionários que visem medir e/ou avaliar construtos psicológicos, (2) garantir conhecimentos essenciais para que se reconheçam os instrumentos que poderão ser adequadamente utilizadas na prática de avaliação psicológica em diversos âmbitos laborais, (3) permitir o aprendizado de novas técnicas de avaliação psicológica, (4) possibilitar o conhecimento de novos softwares e/ou técnicas de análises de dados, (5) permitir que se conheça o que tem sido realmente feito na área no país, tanto no nível da pesquisa como da prática psicológica.

Direito de todos, dever do psicólogo
O congresso tratará a avaliação psicológica abordando diversos temas, dentre os quais: testes de inteligência, testes projetivos, escalas e inventários de personalidade, testes de desempenho acadêmico, testes educacionais, avaliação neuropsicológica, entrevistas, questionários, observações e testes informatizados. Também abordará discussões práticas sobre a avaliação psicológica nos mais variados contextos, tais como: escolar/educacional, clínico, organizacional/trabalho, social/comunitário, da saúde, forense, trânsito e do esporte. Também tratará de assuntos fundamentais e relacionados à área, tais como: psicometria, teoria de resposta ao item, métodos estatísticos, formação, legislação e ética. No congresso ocorrerão cursos, conferências, mesas redondas, “como eu faço”, apresentações de painéis, dentre outros. 

Público-alvo
Psicólogos que trabalhem ou tenham interesse na área da avaliação psicológica;
Alunos de graduação em Psicologia;
Pesquisadores acadêmicos (graduandos e pós-graduandos) que desenvolvam projetos com temas afins à avaliação psicológica. 
http://www.ibapnet.org.br/congresso2013/?pgn=apresentacao

A paz é a base da felicidade


     Texto publicado no Jornal Opinião dia 12/04/2013 

     
     Semana passada falei sobre o medo que várias pessoas têm de ser felizes. O que parece, como eu disse, paradoxal, já que ser feliz é tão bom, talvez até o que todos nós almejemos. Porém, outro sentimento igualmente importante é a paz. O ritmo frenético dos dias atuais, as cobranças excessivas de algumas corporações, as contas a vencer, as pendências afetivas, tudo isso podem ser agentes ansiosos severos. Sem paz, é possível achar a tal felicidade?
     Vejam os diferentes significados de paz, que achei em dicionários variados: harmonia, concórdia; sossego, tranqüilidade; calma, repouso. Estado de não-beligerância. Fazer as pazes, reconciliar-se. Apesar de ser difícil de definir, creio que não há ninguém que não entenda o que é a paz, ao simples ouvir da palavra. Ainda assim, eu ousaria definir que paz é um estado emocional interno e relativamente constante de serenidade, e até certa resignação, elencada por um conjunto de valores éticos, morais e espirituais, que permitam ao indivíduo aceitar o que ele não pode entender ou modificar, e lidar de maneira mais positiva e saudável o possível com isso, bem como com todos os aspectos de sua vida.
      Na psicologia, entendemos que saúde mental é conseqüência principalmente da capacidade humana de adaptação e desse “lidar positivamente” com as adversidades. Penso que o caminho para sentirmos paz, não seja diferente. A paz é como uma base; um alicerce. Nos dá estrutura, nos torna mais fortes, para não dizer resilientes. Creio que, antes de pensar em felicidade, deve-se tentar experimentar a paz. Sim, escolher o tal conjunto de valores de que falei, exercitá-los nas menores atitudes cotidianas com positividade, confere uma organização interna mínima, para preparar-nos para escalar o monte da felicidade. Lembrando que, o objetivo é o topo; o melhor.  
     Porque a felicidade, me parece mais fabulosa, animada, e inclusive vaidosa, que a paz. A paz é quieta, reservada, ela não requer holofotes ou confetes. A paz sugere o consolo da agonia, da ansiedade pelo porvir, a habilidade de perdoar aos outros e a si mesmo se as coisas não foram nem são perfeitas. A paz conforta, é a força indispensável para sermos felizes.

terça-feira, 9 de abril de 2013

Medo da Felicidade


Texto publicado no Jornal Opinião dia 05/04/13


     
      É uma característica de algumas neuroses o medo do “topo”. Certas pessoas, quando estão perto de atingir um objetivo, alcançar o sucesso, sentem grande ansiedade e dão passos para trás. Por exemplo, pessoas que começam mil coisas e não terminam nenhuma, ou que concluem, porém se entediam com facilidade, como se nada as satisfizesse. A felicidade para elas parece um evento circunstancial e efêmero, quando não o é (isso seria alegria). Grande parte das vezes, a resistência ao topo, ou à vitória, ou ao sucesso, se deve ao medo de conseguir se sentar no trono, e perdê-lo; ou seja, é o medo do fracasso. Pois só é possível fracassar, se houver tentativa de sucesso. E como a felicidade implica certa completude, também requer a tentativa de alcançar bons resultados, para não dizer os melhores.

     “Melhor nem terminar o curso, imagina se eu me formo e não arrumo emprego?” ou “Imagina se eu arrumo o emprego e não sou bom?” ou “Imagina se eu for bom mas fulano for melhor?”. Em geral, pessoas com medo da felicidade apresentam insegurança quanto ao próprio potencial, baixa autoestima ou ainda um medo exacerbado de falhar, por não atingir as expectativas alheias ou próprias. Para evitar o risco de fracassar, muitos optam pela zona de conforto, que é a acomodação, o não-desafiar o próprio ego. Logo, consideram mais apropriado colocar a culpa na dor de barriga, por causa dela faltaram a prova do concurso. Ou no mercado de trabalho, que é “ruim”, é “injusto”, ou o chefe é “chato”, por isso não são bem-sucedidos. Desse jeito, nunca serão fracassados. Correto?

     Errado. Desde quando o quase, a metade, o pouco, ou restos fizeram alguém feliz? O maior fracasso de uma pessoa é a infelicidade. Portanto, é preciso ter sonhos, e esforçar-se para realizá-los. Conclua, finalize, concretize, feche o ciclo para que outro recomece. Aprecie a simplicidade de um dia bonito, namore, passeie, trabalhe, seja capaz de ter um mínimo de ternura, para conseguir se satisfazer até nas amenidades cotidianas. Abandone as dores ou questionamentos profundos, arrisque-se sendo raso... Valorize aquilo que aparece, que está na superfície, que levanta por força própria porque quer respirar. Descomplique.

     Ter medo da felicidade parece até absurdo, já que é tão bom se sentir feliz. Porém senti-la pressupõe ousadia e coragem, posto que substitui a angústia da mediocridade ou da dor, por uma angústia ainda maior, que é a do amor, do risco de viver cada dia. De ser e querer o inteiro - nada de migalhas. A felicidade exige o mais difícil: que abandonemos a acomodação e sejamos plenos. Se você não consegue ser feliz, mesmo munido dessas orientações, busque uma psicoterapia. E seja feliz! 


sexta-feira, 8 de março de 2013

Características do usuário de drogas


Texto publicado dia 08/03/13 no Jornal Opinião            

       
        O uso de drogas, diga-se de passagem, é histórico. Desde sempre o homem fez uso de ervas, combinações alimentícias ou químicas, com a finalidade de se entorpecer. Entretanto, hoje temos algumas drogas potencialmente destrutivas, que causam uma dependência orgânica severa, que podem destruir por completo a vida de uma pessoa. Visto que o perigo das drogas atuais parece maior, e que a dependência química já é considerada uma doença pela OMS, tendo inclusive CID (classificação internacional das doenças) próprio, vários estudos científicos tem dado subsídios para identificar alguns traços de personalidade comuns a usuários de drogas, com a finalidade de auxiliar tanto a usuários, familiares e profissionais da área, a realizar desde ações preventivas à dependência quanto de tratamento e apoio.  
         Vejam o exemplo da morte, ontem, de um grande compositor e músico brasileiro, o Chorão: embora ainda inconcluso, o relatório aponta que seu falecimento pode estar associado ao uso de álcool e cocaína feito por ele no dia. Antes de morrerem, os dependentes químicos em geral tem sua vida pessoal e profissional destruída também. A exemplo do cantor, que estava em depressão devido ao divórcio, levando uma vida desregrada e sem sentido, muitos usuários já apresentam distúrbios emocionais antes mesmo de usar drogas. Tais transtornos, não sendo devidamente tratados, levam algumas pessoas a escolher as drogas como um refúgio, ou meio compensatório de prazer, ou ainda como uma maneira de extravasar uma postura transgressora.
         E aí vem a pergunta: por que alguns usam drogas para lidar com suas questões, e outros não? Os estudos apontam que os usuários geralmente apresentam alguns “defeitos” de caráter em comum, tais como: comportamento impulsivo, manipulador, tendência a transgressão, dificuldade de aceitar limites, ansiedade, procrastinação, inabilidade de enfrentar problemas, egocentrismo, necessidade de gratificação imediata. Depois de ter trabalhado por três anos numa clínica para dependentes químicos, posso dizer que além de concordar com esses resultados, acrescentaria mais duas características nesse perfil: a negação de seus próprios defeitos, e a disposição para a projeção, que é apontar no outro o defeito que ele mesmo tem, sem se aperceber que o tem.
         Munidos desse conhecimento, as psicólogas que tratam esses casos já tem um protocolo de atendimento focado na compreensão e eliminação desses “defeitos”, que certamente quando trabalhados, auxiliam consideravelmente os usuários a deixar o uso; e, também, podem evitar que pessoas não-usuárias passem a sê-lo, ou que desenvolvam transtornos mentais. Lembrando que, além da psicoterapia, recurso indispensável para o sucesso do tratamento, este requer acompanhamento psiquiátrico e inserção do usuário em grupos de apoio.

quinta-feira, 7 de março de 2013

Mais uma perda para as drogas...


"Eles dizem que é impossível 
Encontrar o amor sem perder a razão 
Mas pra quem tem pensamento forte 
O impossível é só questão de opinião... 

E disso os loucos sabem 
Só os loucos sabem! 
Disso os loucos sabem 
Só os loucos sabem!"

-Chorão

sexta-feira, 1 de março de 2013

Psicólogas, sensíveis e sádicas?



Texto publicado dia 01/03/2013 pelo Jornal Opinião


       Embora a psicóloga seja uma profissional que lida com problemas e distúrbios emocionais o dia todo - o que para muitos pode ser considerado uma tortura – “Como você consegue passar horas ouvindo problemas?”, “Como consegue atender e aceitar uma pessoa que já fez tanta coisa ruim?”, “Você não tem medo de gente maluca?” , é muito interessante compreender não apenas mentes, mas almas, e principalmente lidar com tudo o que descobrimos nelas com bom humor. 

       Certa vez, chegou uma senhora na unidade psiquiátrica com um tubo de desodorante nas partes íntimas. Em seu relato, contou que “esqueceu” o objeto ali, enquanto “brincava” com ele. Havia dois estudantes de engenharia próximos, acompanhando um outro senhor, e eles simplesmente começaram de rir. É claro que a equipe que prestava o atendimento retirou-os da sala, e é claro também que toda essa situação nos rendeu algumas risadas depois. Obviamente, na hora do socorro nenhum dos profissionais riu - sabemos que é uma ocasião de sofrimento, pois a senhora estava em surto psicótico. Mas é fato: necessitamos descontrair, pois mergulhar na dor do outro possivelmente nos incapacitaria de ajudá-lo.


       Há duas características que considero imprescindíveis a toda boa psicóloga: boas doses de sensibilidade e sadismo.  A primeira porque gera empatia, perspicácia e o cuidado vitais à terapia, e a segunda dá estrutura para suportar situações como essa, sem pirar. Uma combinação paradoxal, mas quase “ideal” – penso que pode ser provocante e, ao mesmo tempo, materna. E precisamos disso numa psicoterapia.


       Digo mais: passar o dia ouvindo a intimidade mais obscura dos tipos mais atípicos, patéticos, comuns e fascinantes, mais seus transtornos, ambivalências e recalques – seja em consultórios, empresas ou em hospitais - presume, meus caros, mais que bom humor, mas equilíbrio emocional. Se apenas ouvíssemos... entretanto também os analisamos e os acolhemos. 


       Haja estômago para oferecer um sorriso, e uma palavra certeira, quando uma alma se desnuda, frágil, às vezes em seu pior momento, na nossa frente. Haja cérebro e coração também. É um trabalho cansativo, desgastante, mas gratificante – nada como apoiar alguém no caminho mais solitário e belo que há: sua vida. Nada como facilitar o encontro de respostas ou soluções, que podem até mudar uma vida inteira.